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Então, falando no pudim…

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Então, falando no pudim…

E no meu caso, que tenho diabetes? O que fazer? Se eu comer o pudim inteiro, eu posso simplesmente morrer!

Mas… eu adoro pudim… gosto de doces, da energia que o açúcar oferece. Acredito mesmo que cada pedaço do pudim é uma pequena porção de felicidade materializada e caramelizada.

Porém… se eu comer muito pudim… eu vou morrer mais cedo. Antes do que eu gostaria.

Sabe, por muito tempo eu refleti sobre essa relação entre a minha sobrevivência e a felicidade. Entendi que a diabetes estava no meu caminho por uma questão de hereditariedade. Mesmo porque sempre vivi uma vida com hábitos relativamente saudáveis.

Nunca bebi. Nunca fumei. Nunca usei drogas. Rezava periodicamente. Amava a minha esposa.

É… era uma boa vida. Bem chata em alguns momentos, por sinal.

Porém, quando percebi que pior que sofrer as dores da diabetes foi sentir o fim de uma história de amor de quase 20 anos, a cobranças e julgamentos alheios sobre minhas escolhas, e as consequências de decisões equivocadas…

Eu decidi pegar a colher, e sair por ai… simplesmente para caminhar… até mesmo para o sangue circular melhor, e para sentir menos a diabetes.

Decidi pegar as estradas do mundo. Conhecer lugares, novos cenários. Encontrar novas pessoas, que podem até ser as almas gêmeas de outras existências. Escolhi sentir o cheiro do mar e absorver em mim a força que a natureza oferece para aqueles que estão abertos a receber o novo.

Optei ser pobre. Ir à falência. Por muitas vezes eu não tinha o dinheiro para comprar o pudim, mas eu ainda estava com a colher na mão, caminhando, sem desistir.

Troquei meus bens materiais pelos abraços apertados dos seres mais amados. Meus braços abertos e mãos espalmadas recebem hoje quem precisa de mim, ou aquelas pessoas que eu posso contar quando eu me frustrar por não conseguir o pedaço de pudim que eu tanto queria.

No lugar de acumular riquezas e estabilidade, optei por plantar sementes de amor e cumplicidade nos corações daqueles que estavam dispostos a me receber. Em alguns deles, eu tenho a esperança que, no futuro, representem meu legado na Terra, e alcancem a felicidade de forma mais rápida e intensa do que eu.

Sempre com a colher na mão…

Até que…

Transmutei meus desejos mais profundos em forma de canção. Hoje, eu caminho pela minha estrada cantando as canções que estão salvas no meu celular, mas permitindo que as pessoas ouçam a voz do meu coração, onde a trilha sonora da minha vida revela o que se passa dentro da minha alma errante.

Aprendi a me perdoar para comer o pudim, pois não poderia me sentir culpado depois de engolir o primeiro pedaço. Entendi que perdoar mais e mais rápido as pessoas que eu amo de verdade deixaria esse pudim ainda mais saboroso.

Aprendi a me amar. A me desejar. A sentir tesão por mim.

Aprendi que, para ter o direito de comer o pudim, eu tinha que me sentir feliz por estar vivo, e por ser a pessoa que eu me tornei. Caso contrário, cada pedaço teria um gosto amargo das culpas e decepções. Ou pior: não teria gosto algum, por não representar a essência de uma felicidade genuína.

Enfim… eu sou feliz.

Não tenho tempo para sentar em um sofá para assistir Law & Order. Até porque eu sempre preferi Friends. Porém, de tempos em tempos, eu gasto uns 20, 30 minutos da minha vida em uma padaria.

Minha colher de prata já se acostumou com isso.

Eu peço o pudim inteiro. De preferência o ‘pudim de padaria’, ou a ‘caçarola italiana’.

Porque sou guloso. E porque decidi que felicidade se come de colherada. E, se tiver uma boa companhia, melhor.

Perdi o medo de morrer. Eu sei que vou morrer um dia. Então, se vou morrer, de vez em quando, vou comer sim o pudim inteiro. Depois, basta recomeçar a caminhada, e eliminar o açúcar acumulado para o corpo não entrar em colapso.

Só não posso deixar de comer pudim apenas porque vou morrer um dia.

O Richard Gere nu? Eu dispenso.

 

(Texto baseado em “O Pudim“, de Martha Medeiros).


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@oEduardoMoreira